Deixo-vos aqui, um capítulo completo, do meu livro "Alguém como Tu - a vida nem sempre é como esperamos". Espero que gostem.
CAPÍTULO 8 ^
"E ASSIM COMEÇA UM NOVO ANO. UMA NOVA ETAPA. UM NOVO CAMINHO!"
Dia 31 de Dezembro, último dia do ano. Últimas
horas. Altura propícia para gerar uma pequena reflexão, sobre este ano, que
agora está a caminhar a passos largos para o seu último segundo. Devemos
avaliar todas as emoções que vivemos, todas as alegrias surdas e estridentes,
relembrar as tristezas e entender, como as poderíamos ter evitado, assistir
como se a nossa memória fosse um ecrã de cinema às transformações que a nossa
vida sofreu ao longo de todos estes trezentos e sessenta e cinco dias que
passaram. Cada dia, para mim, é
diferente, por mais monótono que possa ser. Uma reunião com amigos, um passeio
ao volante de um carro a ver as paisagens, enquanto pensas para ti, o que
poderás fazer para compor, ainda o que falta para reconstruir o castelo, que
por um amor doentio desmoronou. Paciência, dedicação, amor próprio e sobretudo
vontade férrea de vencer na vida, são os ingredientes para conseguires
sobreviver neste mundo. Sobreviver e viver não são a mesma coisa. Sobreviver é
um esforço para te sentires minimamente confortável com a vida que tens que
viver, e viver é simplesmente a sensação de estar seguro, feliz, confortável e
até calmo e sereno. Cheguei à conclusão que este ano, não vivi... sobrevivi! No
primeiro segundo deste ano, que agora se aproxima do fim, quando desci do
banco, nem me apercebi que entrei numa espiral. Comecei a andar às voltas
levemente, até que quando cheguei a meio, a velocidade começou a aumentar, e
aquilo que eu julgava ser a minha felicidade evaporou-se. Na realidade, a minha
felicidade, ou a minha suposta felicidade, ficou presa no ano anterior a este.
Este ano, foi uma luta constante, e tive dias de glória, por conseguir passar
as horas de luz, sem aquilo que julguei ser o que me faria feliz para sempre.
Porém, como hoje me apercebi, o tempo passa tão rápido, que há coisas que somos
mesmo obrigados, a pôr de parte. E convenço-me agora, que a melhor acção, que
fiz neste ano, foi abandonar-te! Afastar-te da minha vida! Desligar-me
fisicamente de ti, já que emocionalmente ainda é um problema, que ficou pendente
para se resolver no próximo ano. A cor da camisola que estou hoje a usar é da
cor do sentimento que guardo dentro de mim, para acreditar que irei conseguir
neste ano que se avizinha as coisas que neste não consegui. Principal
objectivo: deixar de te amar e desprender-me de ti de uma vez por todas.
Sinto-me, radiante com a minha prestação ao longo deste ano que passou, porque
aquilo que tinha para fazer, fiz. O que tinha a dar, dei. E o que tinha a
dizer, disse, mas sobretudo, o que tinha a ensinar e a aprender, ensinei e
aprendi. A espiral, foi a estrada, na qual eu andei ao longo deste ano, as
imensas curvas, fizeram-me tropeçar imensas vezes, caí inúmeras, chorei mas
chorei muito, passei noites e dias a pensar que nada mais haveria de bom na
minha vida, quis morrer quando a saudade e este amor louco que senti por ti me
tocavam, a espiral deu tantas e tantas voltas, que cheguei a uma conclusão que
ditou completamente a minha maior surpresa deste ano: lentamente estás a sair
do meu coração, e a começar a desviar-te para outro caminho, que não é o meu.
Como te disse certa vez: “As desilusões foram as responsáveis pelo fim do meu
amor por ti”, nunca imaginei que esta frase se tornasse profética. Às vezes
dizemos as coisas sem as pensar primeiro, contudo a vida, leva-nos aonde nunca
imaginamos, e chegamos mesmo a perceber que se calhar uma frase dita sem
sentido há uns tempos atrás, ditou uma profecia esquisita, mas boa. As mudanças
deviam ser sempre para melhor, pena que aconteça o oposto.
Estou contente comigo mesmo. É
este a conclusão a que chego, ao final da minha reflexão ao ver o que este ano
vivi. Lutei, sofri, ri, chorei, sorri, ajudei, caí, imaginei, concretizei,
parei, avancei, vendi, comprei, afastei-me e aproximei-me, este ano fiz um
pouco de tudo, e é notável o meu esforço, e notável também a forma como esse
meu esforço, está a começar a dar frutos. Uma reflexão é sempre necessária,
traz-nos ajudas, dicas e novas formas de encarar o mundo ou a vida, por vezes
só podem surgir uma vez na vida, e temos que as agarrar. As lições são para ser
escutadas, é um facto, mas melhor é serem aprendidas, para mais tarde não
cairmos no mesmo engodo. Nem te sei dizer se já aprendi a minha lição, mas não
estou com pressa em dar-te uma resposta, aprendera contigo uma lição
importante: “O que tiver que ser será!”, por isso mesmo hoje em dia, não penso
muito no dia de amanhã, e deixo-me pairar sobre o ar do dia de hoje. Porque no
fundo é o hoje que importa, o amanhã já pertence ao futuro, e tentar dar uma
importância ao dia de amanhã é errado. É como dar um tiro no escuro, e não
saber para onde foi o chumbo.
Estava deitado sob a minha cama,
quando me deu uma súbita vontade de escrever. Já tivera feito de manhã a minha
reflexão, mas não tinha feito ainda uma coisa muito importante, despedir-me de
ti, pois faço questão de te deixar neste ano, que está quase, quase a ser
ultrapassado.
“Há coisas
na vida que não têm explicação, há coisas que não podem mudar, ou não se
consegue mudar, há pessoas que não devemos amar e mesmo assim amamos.
Sofremos por fazer coisas que não devemos, do género amar quem não nos ama,
querer quem não nos quer. Às vezes mentimos para nos livrar-mos de alguma
consequência, mas acabamos descobertos. Amar
demais, querer demais, fazer demais, chorar demais, tudo demais é veneno! Meu
veneno foi amar demais e chorar demais. Amar demais quem não me amava, chorar
demais por quem não merecia. Sofri por cada erro e sua consequência e ganhei
por te perder. Perder-te foi um ganho de certa forma, é como eu disse no começo
"há coisas que não tem explicação", não dá p’ra explicar como ganhei,
mas posso afirmar que ganhei, e muito. Estou certo de que tu nunca irás sentir
a minha falta, embora eu ainda sinta a tua. Mas saudade passa, amor passa, solidão passa, demora, mas passa. Um
dia tudo passa, por que afinal nada dura para sempre!”.
Foi este o texto que serviu como uma despedida
à tua pessoa. Publiquei-o no meu Blog, com a esperança, não que o lesses, mas
que muita gente percebesse, que realmente, a vida dá voltas e por isso mesmo
nada é para sempre. Em tudo o que escrevo, tento dar conselhos, ajudas, e até
tento dar dicas à vida de quem passe o mesmo que eu já passei. Tudo o que
escrevo, ou o que escrevi até agora, foi em tua homenagem, e foste tu quem me
inspirou, mas agora, que sinto que estás lentamente a sair do meu coração, que
foi a tua casa durante anos, estou mais aliviado, e com uma maior esperança, de
que é mesmo neste novo ano que te vou escorraçar da minha vida e do meu
coração. Vou finalmente, voltar a ter aquilo que sempre me pertenceu, mas que
estava em tuas mãos há muito tempo. O meu coração. O meu maior bem, porque é
ele que me faz viver. É engraçado, há uns dias atrás, estava a cair aos
bocados, mas confesso, que aquela conversa com a Dona Maria, me ajudou, e me
fez renascer um sentimento leve como uma pena, que vagueia por cima dos meus
sonhos, e os protege. Sinto-me leve, não solto. Porque ainda não tenho todo o
meu coração, mas já o comecei a recuperar. É uma sensação indescritível, é algo
estupendo, é um sentimento sem nome, é uma bênção de Deus, uma alegria
extasiante.
No final do ano passado, uns minutos antes da
viragem do ano, veio à minha cabeça, uma frase, que escrevi logo no meu
telemóvel e te enviei em seguida. Era um grande conselho. Era uma grande ajuda,
e uma porta aberta, para começares a ser realmente feliz. Passo a citar essa
frase, que me ficou presa na memória, como uma marca na minha pele.
“Vive a vida sem reservas, sem medos. Pratica o teu
desporto preferido. Torna-te fã, daquilo que detestas. Ama, quem te odeia.
Aceita o pouco que tens e não aceites grandes ofertas. Bebe o cálice do amor.
Aprende a amar. Ensina o amor. Esquece as lágrimas. Aborrece as tristezas.
Desvia os maus caminhos. Emerge por entre as ondas que levam aquilo que amas.
Sai dos locais onde possas ser infeliz. Viaja para descobrires o sentido da
vida. Conhece o teu amor. Desfruta-o. Aprecia-o. Mas acima disto tudo ama-o.
Tal como eu faço.”
Pouco tempo
depois, quando escrevi, o meu primeiro livro, usei esta mesma frase, como a
final. Porque acho que traduz bem, o caminho certo para ser feliz. Não dei o
devido valor a esta frase este ano, mas guardei-a sempre no meu coração, e hoje
veio à minha memória, para me relembrar que este ano, esta frase deve ser a minha
chave para abrir o baú da felicidade, ainda tenho pena, que não tenha sido a
tua chave este ano, quem sabe, não poderia ter sido tudo de uma maneira
diferente. Mas pronto, o passado já passou, e não há maneira de o modificar,
por mais que em certos casos, até tenhamos vontade de o modificar, porque
achamos sempre que não foi o melhor. Mas aquilo que se julga como o melhor,
tantas vezes, não o é, mas naquela altura pareceu-nos sê-lo. Não adiante chorar
pelo leite derramado, não adianta perder o nosso tempo do presente, a relembrar
o passado, não vale a pena amar, desejar, um sentimento ou uma pessoa, se para
esse mesmo sentimento, ou essa mesma pessoa, o nosso sentimento e nós mesmos
não somos nada nem ninguém. Não fui o teu sonho perfeito, nem o teu príncipe
encantado, tentei sê-lo, mas não consegui alcançar o teu coração, até aqui tudo
bem, mas não me conformo por me teres feito juras e promessas, que deitaste
fora como se não valessem nada. E no fundo não valeram, da tua boca tudo o que
sai, sai e pronto. Como disse a Catarina uma vez: “Estás à espera que uma
criança deixe de brincar, só para começar a trabalhar no duro, e deixar o mundo
dos sonhos? Deixa lá, um dia todos haveremos de perceber, que a vida não é só
uma brincadeira, é também um grande trabalho”. É verdade, dá trabalho viver,
muito por sinal, principalmente quando somos confrontados com o facto de
vivermos com uma história platónica e proibida, como foi a nossa. Não soube
lidar correctamente com esta realidade, e vi no mundo dos sonhos e da minha
forte imaginação, a minha tábua de salvação. Fui estúpido, se tivesse aceitado
a realidade naquela altura, provavelmente, teria gasto apenas umas semanas de
sofrimento, e não os meses todos de um ano completo!
Recebi, por
volta das 13 horas e 30 minutos, uma mensagem escrita no meu telemóvel do
Rúben, a marcar um encontro comigo, pois tem uma novidade de fim de ano
bombástica para me dar, até já faço uma ideia, do que seja. Já conheço o Rúben,
o meu melhor amigo, é o rapaz mais transparente que conheço. Aposto que a sua
novidade bombástica de fim de ano é: fiz amor com a Catarina num lugar cujo o
mapa não indica, e onde a cama e os cobertores não fizeram parte. Ele adora
este tipo de aventuras, só não sei é se a Catarina iria alinhar numa coisa
destas. É esperar para ver. Mas apostaria com quem fosse, que o que indiquei em
cima é mesmo a novidade que ele tem para me dar! É, conheço os meus amigos, tão
bem, que é como se fossem uma parte distinta do meu corpo. Cheguei, por volta
das três da tarde, ao local combinado pelo Rúben, e como não podia deixar de
ser além do lugar ser sempre o mesmo, o bar do campo de futebol da minha
aldeia, ainda chegou um quarto de hora atrasado. Nada que não seja habitual. O
Rúben, nestes aspectos, já não me consegue surpreender. Uma das coisas, que
gostava em ti, e agora já nem sei se foi algo bom ou mau, era o facto de me
conseguires surpreender. Nem sempre pela positiva, ou melhor, a maior parte das
vezes que me surpreendeste foi por aspectos negativos, mas o que interessava, é
que realmente me surpreendias. É muito difícil alguém me surpreender. Quando
tentam, ou já sei o que vai acontecer, ou então não é nada que eu já não
estivesse à espera. Claro, que como um bom actor que sou, disfarço, que fiquei
muito surpreso, para não desiludir, quem por vezes tenta surpreender-me. O que
conta, em tudo na vida, é a intenção, e não a acção, ou o resultado dessa mesma
acção. Acho que para conseguirmos surpreender alguém verdadeiramente, é preciso
ter-mos, imaginação suficiente, quem não a tem, provavelmente nunca irá
conseguir surpreender alguém verdadeiramente. Os atrasos, os locais de
encontro, as conversas sobre miúdas, e todas as barbaridades que de vez em quando
o meu irmão emprestado faz e diz, não são de todo, uma surpresa.
Enquanto
aguardava pela chegada do “Boss Rúben”, sentei-me na esplanada do bar, embora o
frio se fizesse sentir, e pedi um Ice Tea de manga, o meu sumo preferido, e
pôs-me a olhar para a paisagem. O campo de futebol, está rodeado de uma
floresta imensa, árvores para todos os gostos, pinheiros bravos e com algumas
galhas já caídas no chão. Ouço o som das árvores e pinheiros, a deslizarem ao
sabor do vento, que se faz sentir, olho para o imenso campo que a minha vista
alcança, e está ali, há minha frente, a mais serena e bonita, paisagem de
inverno. Para completar, a neve volta, e sem me aperceber, o piso começa a
ficar na cor das nuvens, e a brisa começa a ficar cada vez mais fria. Quando
estava já embalado e completamente deslumbrado, com a paisagem que agora passou
a ser branca, sinto uma pancada na nuca, nem resmunguei, porque já sabia que
esse é o cumprimento preferido do meu irmão emprestado.
- Então
brow?! – agora dá-me o segundo cumprimento, este mais normal e bonito que o
primeiro, que é um aperto de mão e um abraço. Está feliz e contente, como é
habitual.
- Mais uma
vez atrasado, não é Rúben?
- Eish,
desculpa lá mano, estive a ajudar o meu cota, a compor a garagem, para a festa
de fim de ano que os meus cotas vão dar esta noite. Por falar, nisso a tua mãe,
vai brow! Vamos passar o ano juntos.
- A minha
mãe vai? – questionei completamente surpreso.
- Vai. Não
sabias?
- Não. Ela
não me disse nada. Mas é bom, porque assim vou passar o ano contigo, meu irmão.
O Rúben
esboça um grande sorriso, mas em breves segundos, o seu sorriso vai-se esmorecendo,
e fica com um ar de alguém que está noutro mundo, o rosto dele mostra alguma
aflição, e sinto as mãos dele, entrelaçadas uma na outra, ambas a tremerem.
Algo não está bem com o Rúben.
- Que se
passa, Rúben? – questionei, porque afinal, o meu irmão emprestado não está bem.
Conheço-o tão bem, como conheço todas as frases de amor que já inventei, muitas
delas dirigidas a ti, como bem sabes.
- Mano, -
enquanto soletra esta palavra, - tão bonita, porque não há nada melhor, que
termos um amigo a tratar-nos como se fôssemos realmente da mesma família, e
como se o sangue fosse o mesmo, - engoliu em seco – estou com um pequeno problemazinho.
- Será que é
assim tão pequeno?
Para o
Rúben, mesmo que um problema possa ser o mais grave, ou o mais sério, para ele,
é sempre pequeno. Não gosta nada de dar grande importância à negatividade. E
quer queiramos quer não, problemas pertencem ao grupo das coisas negativas.
O Rúben
sorrio. Foi um sorriso de compreensão. Porque ele sabe que o conheço tão bem,
quase ou ainda melhor, do que ele próprio. Por exemplo antes dele saber que
gostava da Catarina, já eu o sabia.
- É um
problema meu, e de outra pessoa ao mesmo tempo. Estou desesperado.
- Queres
contar?
- Isso ainda
se pergunta, mano?
Nunca se
sabe. Umas vezes, gostamos de partilhar com os nossos melhores amigos, as
nossas alegrias e tristezas, outras em que preferimos guardá-las só para nós.
Por isso, fica sempre melhor perguntar.
- Eu e a
Catarina. É este o problema.
- Como
assim? – inquiri, porque não estou haver qual será o problema deles. Quer
dizer, se me perguntassem se eles namoram, eu não saberia o que responder. Mas
eles lá devem saber o sentimento que os une.
- Oh! Fomos
muito irresponsáveis. Não devíamos ter feito o que fizemos desta forma. Não
devíamos.
Interpelei
para mim mesmo, o que será que aconteceu. A conversa estava a ganhar um rumo
para a confusão. Já não estava a perceber nada de nada, o Rúben percebeu, e
finalmente me esclareceu.
- Eu e a
Catarina, fizemos amor. Mas não usamos protecção. E ela está no seu período
fértil, a probabilidade de ela engravidar é elevadíssima. Meu, não estou
preparado para ser pai, aos dezasseis anos!
Não pôde
deixar de ficar furioso com esta afirmação. Quer dizer, andam aí milhares de
pessoas, a utilizar tantos meios, para alertar ao uso do preservativo, e este
agora, não dá ouvidos aos conselhos, que são no fundo, importantíssimos para a
segurança da nossa saúde, e da nossa vida.
- Eu não
acredito! Rúben, tu és um rapaz, com o conhecimento do valor do preservativo e
não usas? Como é isto possível? – ergui o tom de voz, porque fiquei revoltado
com a situação.
- Oh irmão,
quando o calor entre dois corpos é quase insustentável, e o desejo de possuir o
corpo dela, se abate sobre mim, não consigo pensar em mais nada. Quando o
fizemos, não era suposto fazermos, mas o desejo bateu tão fortemente, e não
pensamos em mais nada.
Há tantas
pessoas que certamente, já passaram por esta situação. O desejo cega-nos,
impede-nos de pensar, filtra-nos os conhecimentos, inverte a realidade, e
gela-nos o cérebro. Os homens têm dois cérebros. O da cabeça e aquele que é no
fundo o nosso órgão genital, quando o da cabeça não funciona, é o debaixo que
pensa e que faz as coisas sem conhecimento, do que se está a fazer. O desejo,
quando gela o cérebro de um homem, é o debaixo que começa a funcionar, e
depois, não há nada que se possa fazer para o travar. Felizmente, eu uso os
dois cérebros, nas alturas certas. A história do Rúben, no fundo é a história
de tantos outros rapazes, que por um desejo delinquente, se entregam, e não
olham para o que estão a fazer, e depois surpreendem-se, quando as namoradas,
ou as raparigas das curtes, aparecem a dizer que estão grávidas, ou num caso
mais grave, a dizer que têm um doença. Depois ficam apavorados. Já era a altura
destes adolescentes saberem, que tudo o que se faz, terá uma consequência, no
futuro.
- O uso do
preservativo Rúben, é importantíssimo meu. Não te devias ter descuidado dessa
forma. Eu compreendo que o desejo consegue ser mais forte que tudo quando quer,
mas tu também tens que aprender a controlar essas hormonas, e começar a usar o
cérebro, quando fazes seja o que for. Sexo, é bom. Mas não trás só o prazer de
quando se o faz. Trás outras consequências, que na tua idade, não são as
melhores.
Senti-me um
“cota” a falar com o Rúben sobre este assunto. Às vezes os amigos podem ser
irmãos mais velhos, ou até segundos pais. E, eu tentei fazer entender ao Rúben,
que há coisas que depois de feitas se tornam irreversíveis e mudam a nossa vida
para sempre. Uma gravidez da Catarina, iria mudar não só a vida dele para
sempre, como iria comprometer o seu futuro, iria atrasar a sua vida toda. Não
só a vida dele, como também a vida dela. Bem, quando recebi a mensagem dele,
nunca pensei, que fosse um assunto assim tão grave.
- O que é
que eu faço irmão? – indagou o Rúben, como se eu pudesse dar uma resposta, que
só ele pode encontrar dentro do seu coração.
Mas tentei
ajudar, da melhor forma que pôde.
- Rúben,
antes de mais, não vale a pena chorar pelo leite derramado. Agora, tu e a
Catarina, têm que saber, se ela está ou não realmente grávida, e só depois de
se saber o resultado, é que deverás pensar no que queres fazer. Ou melhor, tu e
ela. Porque se ela realmente estiver grávida, tu vais ter que tomar, uma
decisão em conjunto com ela. Serviste para fazer o filho, também hás-de servir
para a apoiar.
- Ela
disse-me, que amanhã, ia comprar um teste de farmácia, para ver se estava
realmente grávida, e que mal soubesse o resultado me diria.
-
Preservativo, pílulas normais e do dia seguinte, há tantas formas de poder
evitar-se uma gravidez, mas uma doença sexualmente transmissível não, Rúben.
Depois de estar feito, não há nada para se poder voltar atrás. Numa gravidez,
pode-se recorrer ao aborto, mas numa doença que pode provir de uma relação
sexual não.
- Eu sei, eu
sei. – proferiu estas palavras, com um grande peso na garganta. Realmente deve
esta desesperado, e sem norte na sua vida.
- Mas
independentemente, do resultado do teste da Catarina, quero que saibas que
estarei aqui, como estive até agora, meu irmão.
O Rúben
aproxima a sua cadeira da minha e dá-me um grande abraço, sussurra-me um
obrigado ao ouvido, e eu passo-lhe a mão sobre a cabeça, como se o erro dele,
não o tivesse comprometido, ou mudado a vida dele.
Quando
cheguei à porta de minha casa, vi o carro do meu pai, e acelarei o passo, para
o ver. Já não via o meu pai há uns dias, e confesso que até já tinha saudades
dele. Quando abri a porta, vi o casaco preferido dele, que por sinal, fui eu
quem lhe ofereceu, pendurado no hall da entrada, dirigi-me à sala de estar,
onde a lareira se encontra acesa, cujo calor se propaga até ao hall da casa.
Quando entro na sala, encontro o meu pai de costas para a porta e de frente
para a lareira, meio cambaleante dirijo-me a ele, e tapo-lhe os olhos.
- Filho! –
diz-me ele com aquela voz de anjo. Tiro as mãos dos seus olhos, e ele vira-se
em minha direcção e dá-me um abraço apertado. É bom sentir, o abraço do meu
pai. Apesar de ele ter feito a minha mãe sofrer de uma forma, tão forte e
descontrolada. Mas decidi pôr esses momentos no passado, e dar uma oportunidade
ao meu pai. Afinal, pai é pai, e faça ele o que fizer nunca o vai deixar de
ser.
- Tu por cá pai?
- Sim filho.
Os pais do Rúben convidaram-me a ir passar a casa deles a viragem do ano.
- Ah, que
bom. Eu e a mãe também vamos. Por acaso não sabia até à pouco. Foi o Rúben que
me disse.
- Achas que a mãe, vai querer vir comigo?
- Ai pai! Vou ser sincero como sempre fui, não
esperes que se ela for, esteja a teu lado, como um casal normal, até porque
vocês já não são um casal.
- Eu sei, meu filho. Mas...
A minha mãe
chega, e interrompe o discurso do meu pai. Dirige-se a mim, dá-me um beijinho
na testa.
- Filho, tenho uma novidade para ti.
- Sim mãe, já sei. Vamos passar o ano a casa dos
pais do Rúben.
- Como sabes? – perguntou ela com uma cara de
surpresa. A minha mãe já deveria saber, que os filhos podem não contar tudo aos
pais, mas aos amigos contam.
- O Rúben disse-lhe! – o meu pai intrometeu-se na
conversa, para tentar chegar à minha mãe, mas ela não lhe dá hipóteses.
- Hum, muito bem. Vai-te lá vestir, filho. Porque
vamos jantar também a casa do Rúben.
Saí de cena.
Os meus pais ficaram os dois imóveis a olharem um para outro, quem sabe a
relembrar, os anos que passaram juntos, com todos os bons e maus momentos.
Também sonho construir um amor como o que eles viveram, não contigo, porque já
percebi que felizmente ou infelizmente a minha felicidade não passa por ti. Já
passou, mas agora já não passa, nem voltará a passar.
Há já umas
semanas, que não te vejo, que o meu coração anda sossegado por saber que não há
hipóteses de te encontrar. Nem que para isso tivesse que sair da cidade, onde
tínhamos obrigatoriamente que nos encontrar sempre. Tomei essa decisão, porque
tive plena consciência, que o melhor era afastar-me. Há alturas na vida em que
não há outra alternativa senão o afastamento. Afastei-me do teu corpo e de ti,
com medo de sentir as agulhas a percorrerem o meu coração, cada vez que te via.
Sentia o meu coração a saltar como nunca outrora saltou. Descontrolaste o meu batimento
cardíaco, e vivia consoante as emoções que me ias fazendo viver. Podes
orgulhar-te. Já tiveste a vida de um ser humano sob o teu máximo controlo. Nem
toda a gente se pode gabar de uma proeza dessas.
Faltam umas
horas, para a viragem de um novo ano. O meu pai conduz o carro, e a minha mãe
está ao seu lado, e eu, como qualquer filho vou no banco de trás, olhando por detrás
do vidro embaciado, relembrando os bons momentos, de quando ainda tinha uma
família normal, o teu amor ou a tua amizade, de quando tinha uma felicidade, ou
um mínimo motivo para sorrir. Irónico ver o quanto as coisas mudaram ao longo
de trezentos e sessenta e cinco dias. Tenho plena consciência, que os próximos
trezentos e sessenta e cinco dias, irão ser de biliões de mudanças, desta vez,
espero que para melhor, como é óbvio. Enquanto vou a olhar a paisagem sinto o
meu telemóvel a tremer no bolso das minhas calças de cinta descaída, que o meu
pai diz ser “a vergonha autêntica”, ou a minha mãe que diz “parece que nem tens
rabo”! Pego no telemóvel, e vejo uma mensagem de um número desconhecido. Fico
um pouco surpreso e ao mesmo tempo nervoso. Não gosto de todo, receber
mensagens de números que não me são conhecidos. Abri a mensagem, que dizia:
“Espero muito sinceramente que este ano, em que vamos entrar, te dê e te traga
o que este não te trouxe. Uma boa passagem. São os meus votos para ti”. O meu
coração acelerou o ritmo, as pernas ficaram paralisadas, a respiração tornou-se
ofegante, os olhos azuis inundaram-se, os braços ficaram imóveis. Será que este
número desconhecido era teu? Será que foste tu que enviaste esta SMS? Porém,
passados uns segundos, voltei a mim e tomei consciência, que certamente não
serias tu. Não te lembraste de mim ao longo de meses, não ia ser hoje, que o
irias fazer. Nem tentei saber, de quem era o número, muito pelo contrário,
apaguei a mensagem, e fingi que nunca a recebi. Decidi enviar uma mensagem à
Catarina, a dizer que já sabia, da sua suposta gravidez, e deseja-lhe um bom
ano novo, e claro muita sorte para o teste que iria fazer no dia a seguir.
Mandei outra à minha irmã emprestada (à Inês), desejei um bom ano, e que o sonho
por o qual ela lutava se tornasse real neste novo ano. Ela sabe que entrar no
mundo da televisão é algo complicadíssimo, mas nunca desistiu. Já fez vários
castings, mas o máximo que conseguiu, foi uns anúncios de publicidade, e uns
catálogos de moda. Ela sabe, que tudo o que já conquistou, foi devido ao seu
esforço, e está disposta a esforçar-se mais. Eu também tinha curiosidade em
experimentar representação, desde sempre sonhei em conhecer o mundo da
televisão por dentro, saber o que está por detrás das câmaras, contudo, nunca
fiz nada para que isso se tornasse real. Quer dizer, tentei uma fez, uma
pré-inscrição, para um casting da série juvenil mais famosa em Portugal:
“Morangos com Açúcar”, ainda recebi uma resposta, que pronunciava o facto de eu
ter habilitações para integrar o elenco, apenas tinha que me deslocar à
agência. Só que o pior era arranjar transporte e estadia. Como ia eu para
Lisboa, sozinho e sem um tecto? Seria com certeza uma grande aventura, e
gostaria de a ter vivido, mas pronto desisti. É. Desisto facilmente das coisas.
De ti, não foi facilmente, só desisti quando a loucura estava a atingir-me num
grau descontrolado. Antes esquecer-te, que ficar louco e internado numa clínica
de psicopatas. Nada contra, atenção. Mas há coisas que se devem evitar. E eu
gosto muito de estar lúcido.
A vida ou tu
com as tuas atitudes de desamor, ensinaram-me e estão a ensinar-me
a aproveitar o presente, como um presente que da vida recebi, e usá-lo como um
diamante que eu mesmo tenho que lapidar, dando-lhe forma da maneira que eu
escolher. Devo, com certeza ter muitos motivos para te agradecer. O amor
faz-nos crescer, e tu certamente que me fizeste evoluir e crescer.
Cheguei por fim a casa do Rúben, para surpresa
das surpresas, encontro lá o Ricardo, o rapaz em quem eu te falava muitas
vezes, que só pensava em arranjar namorada, mas quando tinha alguma interessada
nele, ele achava sempre que ou era feia, ou então não era a ideal. Curtia
muitas vezes com várias raparigas, que bem, vou ser sincero, eram desprovidas
de beleza. De corpo safavam-se, mas de cara é melhor nem comentar. Fui
juntamente com o Rúben e com o Ricardo jogar PlayStation, escolhemos o Buzz,
para podermos jogar os três, eu escolhi com habitual a cor laranja, o Rúben
ficou com a azul, e o Ricardo com o verde. Senti, algum desconforto no olhar do
Ricardo. Algo se passa com ele. As horas vão passando num ápice, como se o
tempo voasse, e fosse dirigido pela força do vento, e quase de um momento para
o outro, já está a minha mãe e a do Rúben à porta do quarto, a dizer-nos que
falta apenas uma hora para o fim do ano. Uma hora! O que é um hora? Nada.
- Estás bué estranho, Ricardo! -
exclamei eu, porque a forma de estar do Ricardo, não estava a ser a mesma, que
desde sempre ele habituara as pessoas que se relacionavam com ele.
- Depois explico-te, meu. Mas
depois. - indagou numa voz suave, algo esquisito, que ele é mesmo muito dado à
gritaria, de vez em quando, tratava-o por “peixeiro” pela forma como ele a
falar gostava de dar nas vistas.
- Ah! Eu não posso saber, é isso,
ó estupor! - pronunciou o Rúben, um pouco alterado. Ou melhor, fingindo-se
alterado.
- Não é nada disso. Depois
digo-vos o que se passa. Agora não quero nem posso falar sobre isso. E, vamos
mazé, continuar a jogar, porque quero sentir, o vosso gostinho de derrota,
quando eu vos ganhar mais uma vez! - e ri.
- Veremos! - prometemos eu e o
Rúben ao mesmo tempo.
- E então Ricardo, andas com a
Jéssica? - questionou curiosíssimo o Rúben.
- Não. Porquê?
- Vi-te aos beijos com ela na
escola, uns dias antes das aulas terminarem!
- Ah! - sorrio – Foi só uma curte,
nada de mais, Rúben!
Senti um peso nas palavras do Ricardo. Senti
que cada palavra que ele pronunciava lhe pesava na cabeça e provavelmente no
coração. Mas o que será que se passa com este rapaz? Ele está mudado. Ele não é
o mesmo de há uns meses atrás. Esta sua mudança de humor e de posição perante a
vida, causou-me um sensação de incógnita, que eu tenho que descobrir, seja como
for, e de que maneira for.
Faltam apenas cinco minutos para a passagem. A
champanhe está sobre a mesa, onde se encontram também, muitas iguarias. Sonhos,
rabanadas, alguns salgados, sumos, whisky, licores de todas as cores e sabores,
o tradicional bolo-rei, e claro o imprescindível sobre qualquer mesa na noite
de passagem de ano. As passas! Sou muito tradicional e retrógrada em alguns
aspectos. Aquilo que é tradicional nas festas populares e o que provém de há
muitos anos atrás, e ao qual a minha família está habituada a lidar, eu tento
fazê-lo de igual forma. As passas, os boxers azuis, subir com o pé direito para
cima do banco, os doze desejos, nada disso eu deixo escapar antes das doze
badalas se passarem. Pode parecer ridículo, mas tento ter esperança que ao
fazer isto, o ano me corra melhor. Só não sei, o que foi que no ano passado fiz
de errado ao longo da contagem dos doze segundos. Mas seja lá o que eu tenha
feito de errado, não tenciono de modo algum, voltar a cometer uma falha que
comprometa o bom decorrer dos meus próximos trezentos e sessenta e cinco dias.
Um minuto. Faltam apenas sessenta segundos. É
altura de subir o banco. Prepara as passas. E os homens, mais velhos preocupam-se
em abrir as garrafas de champanhe. A televisão está ligada, à espera que se
comece a prosseguir à contagem decrescente. Olho para a minha mãe e para o meu
pai, dou-lhes um beijo, num gesto delicado, dou a mão ao Rúben que está ao meu
lado, com o seu sorriso comum, e o Ricardo encontra-se no banco à frente do meu
e do Rúben. A apresentadora do programa que está a ser transmitido na televisão,
está a prosseguir de igual forma, à minha. O coração começa a sentir ansiedade.
As palpitações vão sendo maiores a cada segundo que passa.
Doze, onze, dez, nove, oito, sete, seis,
cinco, quatro, três, dois, um... e feliz ano novo! Tomo atenção, quando desço
do banco, com que pé o faço. Tem que ser com o direito, e quando saio a porta
de casa para ver o fogo-de-artifício, saio também com o pé direito. Óptimo,
desta vez estive atento a todos os pormenores, não deixar escapar nada, e fiz
todo certo. Este ano vai correr-me bem! A primeira mensagem que envio neste ano
novo, é para a Inês e Catarina, como é óbvio. Dou um abraço super apertado e
forte ao meu irmão emprestado, que sei que independemente dos azares ou
alegrias que a vida me traga, estará sempre ao meu lado, e posso garantir-te,
que é uma amizade inabalável, a que eu e ele temos. Mentir-te-ia, se te dissesse
que eu e ele nunca nos zangamos ou discutimos, como somos muito diferentes um
do outro, discutimos imensas vezes, há semanas, que as discussões acontecem a
todos os dias e a todas as horas, mas como a nossa amizade é verdadeira,
passamos por cima disso tudo. Conseguimos, através de acordos conjuntos, manter
uma amizade equilibrada. Com algumas cedências parte a parte. No fundo todas as
relações, sejam elas com pessoas iguais ou opostas, têm que ter sempre uma
cedência. Um faz isto, o outro faz aquilo. Por exemplo, eu vou com ele aos
jogos de futebol, e ele vem comigo ao cinema, eu ajudo-o, e ele dá-me mais
atenção. Enfim, coisas assim do género, que fazem com que apesar das diferenças
a nossa amizade já resista à sete anos. É uma trapalhada os primeiros segundos
do ano, tens que cumprimentar este e aquele, e ao mesmo tempo estares atento,
ao que fazes. É uma complicação. A minha mãe estava zangada comigo, porque
desci do banco e nem a cumprimentei. Meti o pé na argola, mas para compensar
dei-lhe um beijo longo e um abraço como tantas vezes te dei a ti. Depois fugi
dos braços da minha mãe, para os braços do meu pai, desejei-lhe muita sorte e felicidade
neste novo ano, ele respondeu-me num tom meigo e delicado, que a felicidade
dele era eu, e a minha mãe, e que bastava ver-nos aos dois bem, para ele ser
feliz. Desde que os meus pais se separaram, o meu pai ficou muito filosófico.
Diz cá com cada coisa, às vezes deixa-me sem palavras, e emocionado. Sabes que
me emociono facilmente. Como diz o Rúben vezes sem conta: “És mesmo o meu irmão
sensível”, e tem toda a razão. A festa é animada. À música tradicional
portuguesa, à gente a rodopiar pela sala, os casais beijam-se, os amigos
abraçam-se, e assim começa um novo ano. Uma nova etapa. Um novo caminho.