Nestes últimos dias
tenho-me recordado amiúde, da montanha que escalei há uns anos atrás.
Recordo-me do dia em que alcancei o seu auge pela primeira vez. Foi logo depois
de te encontrar aos beijos com outro rapaz na biblioteca da escola. Esse foi um
dos momentos em que senti o mundo a ruir nos meus pés. Fugi o mais rápido que pôde.
Depois, quando por fim, cheguei à minha terra, sem vontade de ir para casa,
decidi vaguear pela floresta, até que encontrei essa montanha. Lembro-me que a
brisa era fresca, o céu estava nublado, e o frio de
Inverno fazia-se sentir com uma aragem gélida. Antes de escalar a montanha,
fiquei a ouvir o som da água a correr sobre a pequena cascata, que ficava ao
lado dessa mesma montanha. Lembro-me dessa montanha, porque a visitei, ainda em
catraio, com a professora e colegas do jardim-de-infância. A história dessa
montanha tocou-me de tal maneira que ainda hoje, não a esqueço. Segundo a
lenda, a pedra que simboliza a montanha, que tem um risco ao meio, que separa a
pedra em duas partes, abriu-se há muitos anos atrás para acolher Nossa Senhora
de Fátima. Nunca mais esqueci essa história, e acho graça à pedra.
Quando escalei a montanha pela primeira vez,
e cheguei ao cimo da pedra, começaram a cair umas pingas de chuva, a visão era
linda, e o vento que soprava na minha direcção fazia com que os meus soluços
fossem escutados para além do horizonte que a minha vista alcançava. Tinha o
coração gelado depois do que tinha visto uns momentos antes de ter chegado à
montanha. Quase sem forças, deixei-me cair sobre a pedra. Fiquei de joelhos, a
olhar um pequeno buraco com água que estava ao meu lado, a olhar o meu reflexo,
ganhando forças para gritar aos sete ventos, que te amava… e fi-lo, mesmo sendo
uma loucura. Era uma loucura amar-te, sempre o soube.
Nessa tarde, no cimo da montanha, ajoelhado
sobre aquela pedra “dos milagres”, abandonado ao sabor da corrente, chorei
muito, gritei imenso e foi aquele, o primeiro dia em que tive a coragem
necessária para te evitar.
Uns meses mais tarde, encontrei outro refúgio
para me abrigar nas horas mais tristes. Como precisava imenso de me abstrair,
ia dando umas caminhadas pelas ruas e campos da aldeia. Acabei por descobrir
este sítio encantador. Uma ribeira, com um enorme campo verde, rodeado de
árvores. Lá só existe o som dos pássaros a chilrear, e a água a correr na ribeira.
Refugiei-me lá inúmeras vezes. A primeira vez, ainda me refresquei no pequeno
lago que a ribeira proporciona. Depois, encostei-me à beira da Ribeira, e
indaguei sobre o meu próprio destino. Há muito que tinha deixado de esperar
fosse o que fosse do destino.
Antes de abandonar o meu “pequeno paraíso”,
baptizei-o de Ribeira das Lágrimas. Sabia que aquele ia ser o cenário escolhido
para as cenas dramáticas dos próximos episódios. E foi.
Há já algum tempo que não vou até lá. A
última vez que lá estive, foi na tarde, em que me confessaste que tinhas ido
para a cama com um fulano qualquer. Essa tarde foi horrível. Cheguei à Ribeira,
encostei-me de novo à sua margem, e implorei que a água arrasta-se consigo todo
o amor que nutria por ti. Lavei-me, e desejei com toda a força, que renascesse
ali um novo eu, da qual tu não fizesses parte. Aquela água, levou muitas
lágrimas minhas. Naquela tarde senti-me tão frustrado, revoltado, decepcionado,
magoado, injustiçado, que todos esses sentimentos originaram numa avalanche de
lágrimas. Chorei imenso. O que já era habitual.
Acabei essa tarde, enfiado no chuveiro.
Enquanto a água corria sobre mim, e levavam as minhas lágrimas salgadas pelo
esgoto, pensava o que poderia eu fazer para mudar o destino. Questionava-me se
valeria a pena, ir contra o destino. E senti-me mal, por ter percebido de forma
tão nítida, tudo aquilo ao qual fechei os olhos inúmeras vezes durante os
últimos anos: tu não me amavas, era simples.
Depois do duche, vesti o meu velho pijama
azul, o mesmo que me acompanhou em noites frias, a beber chá na varanda, a
esperar algo teu. Quem sabe, apenas um simples mensagem. Era esperar demais de
ti. Há muito que me tinhas posto de parte da tua vida. Há muito que tinha
ficado de fora dos teus interesses, das tuas escolhas.
Segui para a cama, onde adormeci, uns minutos
depois do sol se pôr. Precisava de descansar a cabeça, que me doía. Uma dor tão
forte, mas mesmo assim, mais suportável do que aquela que me causaste, com a
novidade que me tinhas dado umas horas antes…
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